"Em torno dos que nos morrem, há um silêncio que nos chama para mais perto da Vida. Dá-nos a ouvir coisas que não sabíamos ou tínhamos esquecido.
A memória guarda o que foi bom daqueles que nos morrem, o que deles foi dom para nós e para os outros. Contemplando-os, descobrimos mais lúcida e aumentada a nossa capacidade de compreensão e de perdão.
Apenas os mil gestos da ternura importam afinal. E dizemos, baixinho, muito gratos: “Bem-hajas!”
Sem que eles o queiram, o desarmado silêncio dos que nos morrem chama-nos a depor no santuário íntimo da consciência. É assim este mistério maior do que a morte: a quem ama parece sempre pouco o muito que dá. Por isso, mais do que de impotência, a morte fala-nos de imperfeição, de incapacidade, de fragilidade. Os que nos morrem ensinam-nos, no mais fundo de nós, a compaixão.
A morte não retira seriedade à vida. Ao contrário:
– ela relativiza as grandes coisas, o poder, o dinheiro ou os grandes êxitos proclamados ao som de trombetas;
– ela desperta-nos para essas pequeninas e invisíveis forças do amor humano que atuam de pessoa para pessoa, que rompem pelas fendas do mundo como finíssimas raízes ou minúsculas gotas de água e fazem em mil pedaços os mais pesados monumentos do orgulho;
– ela responsabiliza-nos por cada palavra e gesto, por cada uma das nossas escolhas e prioridades.
A morte é sempre uma pergunta sobre o amor que fomos capazes de gerar."